Uma doença misteriosa, que há anos tem afetado a apicultura, conhecida
como "distúrbio de colapso de colônias", parece ter se expandido
drasticamente nos EUA, segundo reportagem do jornal "The New York
Times".
Produtores ouvidos pelo diário afirmam que entre 40% e 50% das colmeias
colapsaram no último ano. Além da produção de mel, as abelhas são
fundamentais para a polinização de inúmeras culturas agrícolas.
"Elas pareciam tão saudáveis na última primavera", disse Bill Dahle,
proprietário de uma apicultura em Montana. "Tínhamos tanto orgulho
delas. Então, lá pelo começo de setembro, elas começaram a cair de cara
no chão, a morrer que nem loucas. Estamos neste ramo há 30 anos e nunca
vivemos uma perda como essa antes".
Apicultores checam colmeias em fazenda em Piedra, na Califórnia
(Foto: Jim Wilson/The New York Times)
A causa desse distúrbio ainda não foi determinada com precisão, mas
desconfia-se que esteja associado com uma classe de pesticidas
introduzidos recentemente no mercado, os neonicotinoides. Eles são
pesticidas "sistêmicos", muitas vezes impregnados nas sementes de modo
que os insetos que comem as plantas tratadas são envenenados.
Ao contrário de outros pesticidas, que se deterioriam mais rapidamente,
esses produtos ficam longos períodos no ambiente. Uma possibilidade
temida pelos produtores é de que as abelhas levem pólen com
neonicotinoides para suas colmeias. Por isso, estariam se alimentando
com doses muito altas de pesticidas que, em porção menor, não lhes
causariam dano, segundo "The New York Times".
Ambientalistas
Um grupo americano de ambientalistas afirmou esta semana que milhares de pesticidas circulam no mercado dos EUA apesar de não terem sido aprovados em rigorosos testes de segurança, colocando em risco a saúde de pessoas, animais e insetos polinizadores, como as abelhas.
O Conselho de Defesa de Recursos Naturais culpou uma lacuna regulatória
no Congresso que data de 1978 e permitiu à Agência de Proteção
Ambiental (EPA, na sigla em inglês) aprovar mais de 10 mil pesticidas
com a realização de testes mínimos.
Este "registro condicional" foi estabelecido para casos específicos,
como o aparecimento de doenças ou crises de saúde pública, mas na
prática foi aplicado em 65% dos 16.000 pesticidas do mercado. "Um dos
problemas que também descobrimos foi que o banco de dados da EPA está
caótico", afirmou Mae Wu, advogada do Conselho Nacional de Proteção
Ambiental, que participou da investigação nos últimos dois anos.
"Não estavam seguindo em absoluto os procedimentos corretos de
registro", acrescentou, em declarações à imprensa, ao observar que o
público nunca esteve envolvido no processo de seleção e que os
pesticidas temporários ficavam relegados a "buracos negros".
A agência ambiental respondeu em um comunicado que está "trabalhando
intensamente para proteger as abelhas e outros polinizadores dos
pesticidas perigosos através de uma regulamentação, do trabalho de
voluntários e de programas de pesquisa".
A EPA também está "acelerando o calendário para revisar os pesticidas
neonicotinoides devido às incertezas em torno destes e ao
desconhecimento de seus potenciais efeitos nas abelhas", disse.
'Plano de ação'
Na Europa, os neonicotinoides também enfrentam polêmica. Também esta semana, os grupos químicos Bayer, da Alemanha, e Syngenta, da Suíça, apresentaram um "plano de ação" para as abelhas, como alternativa à proibição dos neocotinoides que fabricam e que a Comissão Europeia quer proibir.
O plano da Bayer e da Syngenta, que se baseia em melhorar as condições
de vida das abelhas, propõe "tirar a UE (União Europeia) da estagnação
no que diz respeito à saúde das abelhas", indicou o grupo alemão em um
comunicado.
A Comissão Europeia (CE) quer proibir durante dois anos a utilização de
vários pesticidas mortais para as abelhas para quatro tipos de
cultivos: milho, canola, girassol e algodão.
Ela se baseia em um relatório negativo da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos.
A proposta das duas empresas foi rejeitada em meados de março pela
maioria dos Estados membros da UE, mas a CE anunciou uma nova votação na
primavera (hemisfério norte), com o objetivo de que entre em vigor no
dia 1º de julho.
Os três neonicotinoides envolvidos estão presentes nos pesticidas
produzidos pela Bayer e pela Syngenta. De acordo com John Atkin, diretor
de operações da Syngenta, citado no comunicado, a proibição dos
neonicotinoides "não salvaria uma única abelha".
Estudo
Estudo publicado na quarta-feira (27) na revista "Nature Communications" sugere que os neonicotinoides podem embaralhar os circuitos cerebrais das abelhas, afetando sua memória e capacidade de navegação, necessárias para encontrar comida.
A equipe de cientistas estudou os cérebros de abelhas produtoras de mel
no laboratório, expondo-as a pesticidas neonicotinoides usados em
lavouras, e a organofosfatos, o grupo de inseticidas mais usado no mundo
- neste caso, o coumafos -, utilizado para controlar infestações de
ácaros em colmeias.
De acordo com a pesquisa, quando expostos a concentrações similares dos
dois pesticidas encontradas no meio ambiente, os circuitos de
aprendizagem nos cérebros das abelhas logo param de funcionar.
"As duas classes de pesticidas juntas demonstraram ter um efeito
negativo maior no cérebro das abelhas e que podem inibir o aprendizado
das abelhas produtoras de mel", explica Christopher Connolly, do
Instituto de Pesquisa Médica da Universidade de Dundee, no Reino Unido.
Apicultores
de diversos países estão preocupados com o chamado 'distúrbio de
colapso das colônias', que causa desaparecimento das colmeias (Foto:
Eduardo Pioli Alberti/VC no G1)
"As [abelhas] polinizadoras têm comportamentos sofisticados enquanto se
alimentam, que exigem que aprendam e se lembrem de tratos florais
associados à comida', acrescentou Geraldine Wright, do Centro de
Comportamento e Evolução da Universidade de Newcastle.
"A interrupção desta importante função tem implicações profundas na
sobrevivência de colônias de abelhas produtoras de mel porque as abelhas
que não conseguem aprender não conseguirão encontrar comida", emendou.
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